Eu dou a ela a rosa com pétalas desenroladas.
Ela sorri
e cruza as pernas.
Eu lhe dou a concha com o lábio inchado.
Ela ri. eu mordo
e acaricio seus seios.
Eu digo a ela. “Me alimente de flores
com as bocas abertas ”,
e devagar.
ela puxa minha cabeça para baixo.
Sunit Namjoshi, 1980
(Poeta indiana, lésbica e diaspórica)
Engana-se quem pensa que a teologia é feita de apenas palavra. Teologia é feita de corpo, fluídos e tesão. Bem, quer dizer, uma teologia da vida sim. Mas existem as teologias da morte, essas sim, são feitas com palavras vazias que afundam no meio do abismo. Porém, nós, que cremos na ressurreição do corpo, tiramos as faixas de Lazáro e aspiramos uma ressurreição no hoje.
“Linguagem que é nudez maior do que a pele.
Pele arranca-se, Desejo, não.
Essa gente, essa gente achando que boceta aberta é risco,
Ave,
Não sabe que risco maior é de caneta.
Escrever com a boceta aberta,
Ler com o peito rasgado,
E costurar com a linguagem as marcas dos nossos corpos.
Eis o que desejo da arte: risco.”
(Maria Giulia Pinheiro)
O mês de agosto é um mês muito importante, pois desde 1996 o dia da Visibilidade Lésbica foi instaurado. Para além das lutas sociais, nossas companheiras também enfrentam uma série de invisibilidades nos movimentos LGBTI+ e também dentro no movimento feminista. Será que dentro da teologia é diferente? A teologia é marcada por estruturas de poder que excluem a mulher do espaço do pensar teológico, mas é nas margens que vamos construindo teologias de vida, teologias de boceta aberta, teologias sem calcinha. A teologia feminista não pode cometer o mesmo erro de outras tantas teologias que excluem a sexualidade e a confinam no armário. É preciso repensar o discurso e a práxis da teologia feminista para que ela não seja mais uma ferramenta de invisibilizar as lésbicas do campo teológico.
“Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas.” (Apocalipse 2:29)
Que os lábios de nossas companheiras, todos eles, falem aos nossos corpos, a nossa espiritualidade e a nossa teologia. Um breve guia para lermos e co-inspirarmos com nossas irmãs de fé & luta.
Ana Ester Pádua Freire
Ana Ester é brasileira. É Bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (2001). Bacharel em Teologia pelo Instituto Metodista Izabela Hendrix (2014). Mestra em Ciências da Religião, pela PUC-Minas (2015). Atualmente, cursa o doutorado em Ciências da Religião na PUC-Minas, no qual pesquisa as relações entre Religião, Política e Espaço Público. Sócia da Associação Brasileira de História das Religiões, ABHR, e da Associação Brasileira de Estudos da Homocultura. Membro do Comitê Estadual de Respeito à Diversidade Religiosa de Minas Gerais, CDR-MG (Biênio 2018-2020). Colunista da Revista Senso, trabalha com os temas: Teoria Queer, Teologia Queer, Ativismo Queer e Teologia Feminista. É aspirante ao cargo de clériga das Igrejas da Comunidade Metropolitana.
Ana Ester escreve poemas, artigos, capítulos de livro e organizou a edição da revista Senso de mar/abr de 2019. Sugestões de leitura: “NA DESORDEM DO ARMÁRIO EMBUTIDO’: a afirmação da identidade como um sacramento” (REVISTA NURES , v. ano XV, p. 1-6, 2017.); “As gay, as bi, as trans e as sapatão estão tudo na Igreja: Religião e superação da violência de gênero” (Revista Senso, 2018); “Mais dois anos de vida para Jesus”.( capítulo no livro Reimaginar a igreja no Brasil: 40 vozes evangélicas, 2017).
“Nós, LGBTs, vamos construindo espaços de resistência, criando igrejas e lançando mão de métodos interpretativos dos textos sagrados que libertem nossos corpos e nossa vivência homoafetiva. Vamos gritando a mudança: “As gay, as bi, as trans e as sapatão tão tudo reunida pra fazer revolução!” e, pouco a pouco, transformamos aqueles gritos de guerra em gritos de paz.” – Ana Ester

Judith Vázquez Arreola
Teóloga da Libertação, bacharel em Teologia no centro de Estudos Teológicos dos Jesuítas no México, validado pela Pontifícia Universidade do México. É licenciada em Ciências Teológicas na Universidad Iberoamericana. Fez dois mestrados na Universidad Iberoamericana, em Teologia & Mundo Contemporâneo e Direitos Humanos. Judith faz parte do Conselho Consultivo da Comunidade Ecumênica de Magdala. É vice-presidente de ação cidadã da National Construction AC. Faz parte da Sociedade Unida ao direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo que foram os impulsionadores da reforma através da qual o conceito de casamento foi redefinido e este direito foi reconhecido para lésbicas e homossexuais na Cidade do México desde o 4º. Março de 2010. Ele trabalhou em comunidades de mulheres indígenas em Guerrero e Chiapas e é ativista pelos direitos LGBTTTI no México. Judith se define como “Teóloga, Lésbica e Feminista para Libertação”. Ela e sua companheira foram as primeiras lésbicas a se casarem no México em 2011.
“Não temos por que ter medo à igualdade, àquele que pensa ou age de maneira diferente. Não há por que se ter medo de alguém com uma identidade diferente à nossa. É preciso articular e viver com essas diferenças.” Judith Vázques Arreola
Pamela Lightsey
Pamela Lightsey é acadêmica, ativista de justiça social e veterana militar, atualmente servindo como Vice-Presidente de Assuntos Acadêmicos e Professora Associada de Teologia Construtiva na Meadville Lombard Theological School em Chicago. Antes disso, ela foi reitora associada na Escola de Teologia da Universidade de Boston.
Em 2005, Pamela foi ordenada anciã na Igreja Metodista Unida, tornando-se a primeira clériga lésbica da denominação. Como ativista, Lightsey trabalhou na comunidade LGBTQ para acabar com a política militar de “Don’t ask, Don’t tell” e garantir a igualdade no casamento. Protestou contra as forças policiais excessivas durante os primeiros 21 dias de agitação em Ferguson e tem consistentemente colaborado com colegas ativistas no movimento negro, com movimentos de resistência à violência contra mulheres negras e o racismo institucional nos campus universitários.
Suas publicações inclui o livro: “Our Lives Matter: A Womanist Queer Theology,” possui capítulos em livros, como: “He Is Black and We are Queer” e “Reconciliation,” Prophetic Evangelicals: Envisioning a Just and Peaceable Kingdom . Confira a entrevista que ela concedeu no youtube.
“Espero que eles vejam que eu tentei escrever um livro porque eu amo a comunidade LGBT, porque eu amo minha comunidade negra e estou tentando trabalhar contra as interseções de opressão contra essas duas comunidades. Espero que eles a recebam como uma resposta teológica, como minha maneira de combater a homofobia dentro da igreja cristã que muitas vezes oprime as pessoas LGBT.” – Pamela Lightsey
Elizabeth Stuart
Elizabeth Stuart, foi a primeira teóloga do Reino Unido especializada em teologia lésbica / gay / queer a ser nomeada para uma cadeira de professor, quando foi nomeada professora de Teologia Cristã no King Alfred’s College, em Winchester (atual Universidade de Winchester) em 1998, um posto que ela manteve até 2008, quando ela se mudou para a administração acadêmica sênior. Ela é uma ativista de longa data do “Lesbian and Gay Christian Movement ” (Movimento Cristão Lésbico e Gay). Em 2008, Stuart recebeu o Prêmio LGCM por ‘defesa enérgica e profética” em nome de pessoas LGBT, por escrever numerosos livros teológicos pioneiros e por permanecer um membro leal da LGCM’. Stuart foi consagrada como bispa na Open Episcopal Church (Igreja Episcopal Aberta), um pequeno grupo independente dentro do Reino Unido. Em 2006 tornou-se Arcebispa da Província da Grã-Bretanha e Irlanda da Liberal Catholic Church International (Igreja Católica Internacional Liberal), mas se aposentou em 2016.
Ela foi presidente fundadora do “Centro para o Estudo do Cristianismo e da Sexualidade”. Ela co-edita o jornal acadêmico Theology and Sexuality. Escreveu vários livros sobre teologia e sexualidade, incluindo Daring to Speak Love’s Name (Hamish Hamilton, 1992), Chosen: Gay Catholic Priests Tell Their Stories (Geoffrey Chapman, 1993), Just Good Friends: Towards a Theology of Lesbian and Gay Relationships (Mowbray, 1995), People of Passion (co-authored with Adrian Thatcher, Mowbray, 1996), Religion is a Queer Thing (Continuum, 1998) and Lesbian and Gay Theologies: Repetitions with Critical Difference (Ashgate, 2003).
“Quando as pessoas me perguntam como posso continuar sendo católica praticante e ao mesmo tempo ser uma feminista extremamente lésbica, minha resposta é que foi da Igreja Católica que aprendi que Deus era um Deus de libertação que toma o lado dos pobres e oprimidos. . Foi da Igreja Católica que aprendi que Deus é um deus da igualdade e da mutualidade. Foi da Igreja Católica que aprendi que o amor conhece os limites do conhecimento. Foi da Igreja Católica que aprendi que a igreja não era o papa, bispos ou padres, mas todo o povo de Deus, inclusive eu. Foi na missa que aprendi que os corpos são indispensáveis no louvor de Deus e que são importantes. Foi na missa que fiquei sabendo que estava tudo bem para os homens usarem vestidos luxuosos. Na escola do convento, aprendi que o casamento e a vida familiar não eram as únicas opções para um cristão. Fui apresentada a toda uma tradição de santos que desafiou as convenções sociais de seus dias e disse não apenas que Deus os amava, mas que eles eram meus amigos. Foi entre meus amigos católicos que encontrei pela primeira vez a teologia feminista e da libertação. Claro, eu também aprendi que a igreja não cumpriu o que me ensinou, houve um deslize entre a visão e a realidade e isso me escandalizou e ainda faz. Mas a visão me deu permissão para ser lésbica e feminista e, na verdade, foi mais do que permissão, em certo sentido, me fez entrar nessas coisas.” Elizabeth Stuart
Ana Claudia Figueroa
Teóloga e Contabilista. Graduada Teologia pela Universidade Metodista de São Paulo (1990), mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (1993), doutora em Teologia pela Escola Superior de Teologia (2008), graduada em Ciências Contábeis pela Universidade Católica de Brasília (2012), Pós-Doutorado (em curso), em Comunicação e Informação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.. Tem experiência na área de Gestão, Teologia, Educação, com ênfase em Teoria Geral de Planejamento e Desenvolvimento Curricular, Feminismo e Teoria Queer, atuando principalmente nos seguintes temas: Religião e Fundamentalismos, Gestão Escolar,Cultura e Significação. Teóloga queer, aprendiz das potências do feminino no mundo, nas formalidades da academia doutra pela Escola Superior de Teologia.
Ana Claudia possui inúmeros escritos sobre povos originários, cristianismo e teologia queer, entre eles o livro “A letra mata… o espírito vivifica. Conflitos e identidades dos cristianismos originários.” (CEBI, 2016). Dentre os artigos estão: “Tuxáua não é mulher: povos originários, religião e designações do feminino” (Revista Senso, 2019); ” Insistindo por 500 anos: não só de gemidos vive a América Latina!” (capítulo no livro 500 anos de invasão, 500 anos de resistência, Paulinas, 1992). Assessorias e palestras: “Roda de Saberes: Olhar Queer sobre Educação e Fundamentalismos” (2016); ” Intolerância, Violência e Impunidade (até quando?)” (2016).
“Sou teóloga, logo a respiração do conhecimento que me constitui vem dos ventos dos espíritos que habitam o mundo e inspiram os seres humanos em suas trajetórias breves e corrosivamente solitárias no nascer e morrer neste planeta que nos acolhe.” – Ana Claudia Figueroa
Emilie M. Townes
Emilie M. Townes, uma clériga americana batista, lésbica, negra, é natural de Durham, Carolina do Norte. Ela possui um “Doutorado em Ministério” pela University of Chicago Divinity School e um Ph.D. em Religion i n Society and Personality da Northwestern University. Townes é a primeira professora de Religião e Teologia Afro-americana de Andrew W. Mellon naYale University Divinity School e no outono de 2005, ela foi a primeira mulher afro-americana eleita para a linha presidencial da Academia Americana de Religião (AAR) e serviu como presidente em 2008. Em julho de 2008, ela se tornou a primeira afro-americana e primeira mulher a atuar como Reitora Associada de Assuntos Acadêmicos na Escola de Divindade.
Organizou e publicou diversas obras entre elas: “A Troubling in My Soul: Womanist Perspectives on Evil and Suffering and Embracing the Spirit: Womanist Perspectives on Hope, Salvation, and Transformation”; também escreveu “Womanist Ethics, Womanist Hope”; “In a Blaze of Glory: Womanist Spirituality as Social Witness”; “Breaking the Fine Rain of Death: African American Health Issues and a Womanist Ethic of Care”, e seu inovador livro, ” Womanist Ethics and the Cultural Production of Evil”
“A alegria nos desafia a viver um espírito e espiritualidade profundos. A alegria nos desafia a viver a justiça. A alegria nos tira dos vincos das velhas feridas que fazem com que todos nós façamos atos antinaturais como transsexismo, sexismo e heterossexismo. Alegria significa criar comunidades que são corpos de esperança e justiça que cospem na cara da produção cultural do mal.” – Emilie M. Townes
Carter Heyward
Carter Heyward é uma sacerdote episcopal, professora, teóloga, ativista e escritora. Uma pioneira nas áreas da teologia da libertação feminista e da teologia da sexualidade. Ela aborda questões controversas: religião, valores familiares, dependência e recuperação, e a qualidade dos relacionamentos que estabelecemos uns com os outros. Ela transformou a consciência, proclamou as possibilidades de as mulheres serem sacerdotes, as lésbicas serem teológas e abriu caminho para novas abordagens para conectar o divino ao erótico, à justiça e aos limites desafiadores.
Ela se tornou ativista do movimento gay e lésbico (antes que “Bi” ou “Trans” estivessem muito no radar) à medida que os anos 70 progrediam. A chave para ela, como teóloga e lésbica, foi a realização das conexões teológicas, políticas, históricas e psicológicas fundamentais entre opressões de gênero e sexual e movimentos de justiça. Professora da Episcopal Divinity School in Cambridge desde 1971, escreveu inúmeros livros sobre LGBT e teologia, entre eles: “Our Passion for Justice: Images of Power and Sexuality and Liberation (1984); Speaking of Christ: A Lesbian Feminist Voice (1989); Touching Our Strength: the Erotic as Power and the Love of God (1989); Saving Jesus from Those Who Are Right: Rethinking What It Means to be Christian (1999).
“O Espírito nos atrai para um compromisso honesto uns com os outros, incluindo aqueles que podem ser muito diferentes de nós de várias maneiras, Deus nos chama para despertar e aprender a amar e respeitar uns aos outros, ponto final.” Carter Heyward
Referências
https://www.meadville.edu/who-we-are/faculty-staff-and-trustees/faculty/biography/pamela-lightsey/
https://lgbtqreligiousarchives.org/profiles/pamela-lightsey
https://escavador.com/sobre/623532/ana-claudia-figueroa
https://www.escavador.com/sobre/8111356/ana-ester-padua-freire