Na noite mais escura do ano diversas festividades são celebradas, como o casamento de Lakshmi e Vishnu, o alegre retorno do exílio de Rama para Ayodhya, ou as boas-vindas dos Pandavas de volta a Hastinapur, o Kali Puja; porém, todas elas se coincidem com o Diwali.
Diwali é conhecido como o Festival das Luzes, e é celebrado em inúmeros lugares ao redor do mundo. Essa celebração é preparada nas casas e corações por vários dias pelos Hindus, para que a luz entre e ilumine e vida. A simbologia da Luz está presente nas diversas tradições, no Hinduísmo nós vemos Lakshmi como a deusa da luz, os Muçulmanos referem-se a Alla como al-Nur (a Luz), no Cristianismo temos Jesus como a Luz do Mundo, os Judeus percebem o sol como símbolo da divindade e de orientação, os Budistas continuamente procuram a chama da iluminação.

por Ateliê 15
O Bhagavad-Gita, um escrito sagrado Hindu, descreve Brahman (o Supremo Ser) como: “Suas mãos e pés se encontram em toda parte; ele possui cabeças e bocas por toda a parte; ele tudo vê, ele tudo ouve. Ele está em tudo, e ele é.” (BG 13:13)
sarvataḥ pāṇi-pādaḿ tat
sarvato ’kṣi-śiro-mukham
sarvataḥ śrutimal loke
sarvam āvṛtya tiṣṭhati
O professor e teólogo Hindu, Anantanand Rambachan, comenta esse verso dizendo que apesar dessa sloka ser interpretada para atestar que Deus é onipotente e onisciente, é verdadeiro dizer que a tradição Hindu lê esse texto com o ensinamento de que nossas mãos, pernas, olhos, cabeça e ouvidos são instrumentos da divindade em nosso mundo. Padre Bede Griffiths comenta, de igual maneira:
“A pessoa única, o único purusha, a realidade única, manifesta-se em toda criação, em todas as pessoas, e todos os seres humanos são, por assim dizer, suas mãos, seus pés, suas cabeças. Ele está em ti e em mim; ele age por meio de nossas mãos e pés, nossas cabeças e bocas. É como se todas essas coisas fossem seus membros. […] A sabedoria é reconhecermos que esse Uno está falando em nós, e agindo em nós, ao passo que a ignorância é pensarmos “Eu sou o autor”, completamente esquecidos acerca do espírito (Atman).” (GRIFFITHS, 2011, p. 325)
A palavra em sânscrito sarvatah (todo lugar, toda parte) é repetida diversas vezes, sendo enfatizado todas as mãos. Deus está em todas as mãos. Esquecemos acerca do espírito, e somos inundados por nossos preconceitos, racismos, insensibilidades. Nossos olhos e mentes ficam manchados pela treva da ignorância e ilusão ( avidya e maya ), vivendo no mundo da dualidade. Todo processo de dualidade é o princípio da ignorância, que produz o sofrimento. A separação (dualidade) gera desigualdades e sofrimento. Precisamos ir além das dualidades para alcançar Satchidananda: “Deus, ou Realidade Última, é experienciado como ser absoluto (sat), conhecido em pura consciência (cit), comungando bem-aventurança absoluta (ananda)” (GRIFFITHS, 2000, p. 20)
Quando enxergamos nossas mãos com o aspecto divino e as mãos de grupos ou pessoas distintos ao “eu” como mãos não-divinas, não estamos compreendendo a imensidão de Deus. “As mãos de Deus não são apenas as mãos dos hindus, mãos cristãs, mãos judias, mãos budistas ou daquelas que não possuem religião.” (Rambachan). As mãos de Deus estão em todos os lugares. As mãos de Deus são negras, pardas, brancas. São mãos gays, lésbicas, trans, bissexuais, queer. Mãos de travesti, com unhas lindas e pintadas. Mãos dos trabalhadores e trabalhadoras da terra, com calos e grossas. Mãos indígenas, com pinturas sagradas. As mãos de Deus são todas as mãos. Nenhuma mão é excluída.

Diwali por Paresh Maity
Que nessa Festa da Luzes nossas mãos sejam usadas para iluminar. Que Agni queime a Ignorância de nossa mente e que possamos contemplar a unidade de todas as mãos unidas, iluminando umas as outras, em plena diversidade e pluralidade de cores e corpos. Nosso dharma é sermos mãos de Deus em um mundo que tem perdido o amor e justiça como princípio. Na tradição cristã, ao sermos imagem e semelhança de Deus somos co-criadores desse rio de compaixão divina.
Que a nossa prece seja:
Om Asato Maa Sad-Gamaya
Tamaso Maa Jyotir-Gamaya
Mrtyor-Maa Amrtam Gamaya
(Om. Do irreal conduza-me ao real.
Das trevas conduza-me a luz.
Da morte conduza-me à imortalidade.)
Feliz Diwali!
Om shanti.

por Cassie L Sears
Reflexão inspirada:
– “Rio de Compaixão: um comentário cristão ao Bhagavad-Gita” (2011) e” O casamento do Oriente com o Ocidente: Hinduísmo e Cristianismo” (2000) de Bede Griffiths
– Reflexão pessoal sobre o Diwali do professor Anantanand Rambachan postado em seu facebook (2019)