dissabores

sempre pensei na tristeza como uma torneira quebrada que insiste em pingar pelas madrugadas frias. as gotas. os barulhos com um ritmo próprio. a umidade. a solidão da água que não é corrente, que não é útil. 

mas nunca pensei que esse gotejar duraria tanto. que esse gotejar, unido, seria um rio de lamentações de um povo que chora. das lágrimas de todos nós, cada um em sua casa, sem poder se quer oferecer um abraço em solidariedade ou sem poder receber um abraço consolador. 

tentamos nos salvar da maneira possível. palavras. poesia. horas a fio na tv ou nas redes sociais. não sei se tem salvação.

meu lamento é como o salmo 88. “estou como um preso que não pode fugir; minhas vistas já estão fracas de tristeza”. e diferentemente de todos os salmos, este não termina com a esperança surgindo no horizonte… só termina com inquietações, com questionamentos e pedido de socorro.

muitos questionam o motivo de ter um salmo como este nas escrituras… inúmeras respostas e hipóteses! pra mim, a serventia é poder lamentar com ele. apenas isso. ler em outras palavras sentimentos partilhados por tantos em diversos períodos. poder gritar e chorar dizendo: “as trevas são a minha única companhia”. sem a positividade, apenas o lamento, apenas o desabafo… o que vier depois, pode ser a esperança, mas que seja respeitando a dor, que seja depois.  pois até agora, tudo o que temos são dissabores…

e a torneira? continua a pingar…

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